Por Ismael Rocha: Em um mundo cada vez mais digitalizado, as organizações enfrentam desafios crescentes em relação à sua segurança cibernética e superfície de ataque. A cada dia, novas vulnerabilidades surgem, criando brechas que podem ser exploradas por cibercriminosos. Sistemas, dados e processos que antes estavam “seguros” dentro do perímetro da organização agora estão amplamente expostos na internet, aumentando significativamente os riscos.
Essa expansão da superfície de ataque é impulsionada por transformações digitais aceleradas, como a migração para a nuvem, a adoção de dispositivos IoT e o aumento do trabalho remoto. As consequências de uma superfície de ataque não mapeada e mal gerenciada podem ser devastadoras, desde o comprometimento de dados sensíveis até interrupções significativas nas operações de negócios.
Por isso, é vital que as organizações tenham uma compreensão clara de todos os seus pontos de exposição e saibam como mitigá-los antes que possam ser explorados por agentes maliciosos.
Neste artigo, vamos explorar o conceito de superfície de ataque, os principais vetores de ameaça e a importância do mapeamento proativo para garantir a segurança digital.
O que é superfície de ataque?
A superfície de ataque de uma organização pode ser definida como o conjunto de todos os pontos de contato, digitais ou físicos, que podem ser explorados por cibercriminosos para obter acesso a sistemas, dados ou recursos sensíveis. Esses pontos vulneráveis incluem desde aplicações web, servidores, portas e serviços expostos, APIs e dispositivos IoT entre outros.
Na prática, a superfície de ataque não se limita apenas a componentes tecnológicos. Ela também abrange elementos como credenciais de acesso fracas ou vazadas, configurações incorretas de sistemas e até mesmo o comportamento de colaboradores, que podem ser manipulados por meio de técnicas de engenharia social.
Uma superfície de ataque ampla e mal gerenciada expõe a organização a riscos significativos, tornando-a um alvo mais atrativo para cibercriminosos. Cada vulnerabilidade aberta é uma porta potencial para ataques que podem resultar em perda de dados, prejuízos financeiros e danos à reputação.
Exemplo prático:
Imagine uma empresa que possui diversos sistemas expostos à internet, como servidores, serviços e bancos de dados e APIs, mas que não realiza um monitoramento constante nem implementa medidas de segurança adequadas.
Essa empresa se torna um alvo fácil para ataques de ransomware, phishing e exploração de vulnerabilidades conhecidas. Um cibercriminoso pode utilizar essas brechas para sequestrar informações críticas, exigir resgates ou até mesmo paralisar as operações da organização.
Principais vetores de ataques
Os vetores de ataque são os caminhos que os cibercriminosos utilizam para explorar a superfície de ataque. Abaixo, destacamos os principais vetores e técnicas utilizadas, com exemplos e contextos detalhados para maior compreensão.
Exploração de vulnerabilidades
Grupos maliciosos exploram frequentemente vulnerabilidades conhecidas, como falhas em sistemas operacionais, aplicações web e software de terceiros. Alguns exemplos incluem:
- Falhas de injeção (SQL, Command Injection)
- Cross-Site Scripting (XSS)
- Vulnerabilidades em bibliotecas e frameworks desatualizados
- Falhas de configuração em servidores web e bancos de dados
Exemplo de exploração:
A exploração de uma vulnerabilidade conhecida como CVE pode ser usada para invasão, instalar ransomware ou extrair dados confidenciais de uma organização.
Portas e serviços expostos
Portas e serviços expostos desnecessariamente aumentam a superfície de ataque da organização. Serviços mal configurados, como RDP (Remote Desktop Protocol), FTP, SSH, e SMB, são frequentemente explorados. Portas abertas sem controle adequado podem ser exploradas por atacantes para ganhar acesso à rede.
Exemplo de exploração
- Um atacante pode realizar um ataque de força bruta em uma porta SSH exposta e assim conseguir o acesso a organização alvo.
Exposição de banners de serviços web
Muitos servidores web expõem banners que fornecem informações detalhadas sobre o sistema operacional, versão do servidor, e software utilizado. Essa informação pode ser usada por atacantes para identificar vulnerabilidades específicas.
Risco
- Atacantes podem utilizar essas informações para direcionar ataques específicos contra vulnerabilidades conhecidas.
Ausência de DNSSEC em domínios
O DNSSEC (Domain Name System Security Extensions) protege contra ataques de spoofing e manipulação de DNS, ele implementa a corrente de confiança, onde cada nível do DNS autentica o nível subsequente, garantindo a autenticidade das informações desde a raiz até o domínio final, assegurando que as respostas do DNS não sejam adulteradas. A ausência dessa configuração aumenta o risco de ataques de envenenamento de cache e hijacking de domínio.
Risco
- Sem DNSSEC, os atacantes podem redirecionar usuários para sites maliciosos sem que eles percebam.
Credenciais vazadas ou fracas
Credenciais vazadas em repositórios públicos, como GitHub, Deep/ Dark Web ou outros, são um dos principais vetores de ataque em ambientes corporativos. Esse problema ocorre quando desenvolvedores acidentalmente armazenam chaves de acesso, senhas ou tokens em repositórios públicos, permitindo que qualquer pessoa mal-intencionada tenha acesso a esses dados. Além disso, práticas inadequadas de criação, utilização e gerenciamento de senhas também contribuem para aumentar a vulnerabilidade da organização.
Risco e impacto
- O vazamento de credenciais pode permitir que um atacante acesse sistemas internos da organização, realize movimentações laterais dentro da infraestrutura de TI, roube dados sensíveis e até implante malware ou ransomware. Credenciais comprometidas facilitam o escalonamento de privilégios e o acesso não autorizado a serviços críticos. Esse risco é amplificado quando os usuários reutilizam senhas ou quando não seguem políticas de segurança robustas.
- O uso de credenciais vazadas pode acarretar graves incidentes de segurança, como perda de dados, interrupção de serviços e danos à reputação da organização. Além disso, pode resultar em multas regulatórias por violações de conformidade, conforme estipulado na LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados) e no GDPR (General Data Protection Regulation).
Autenticação de e-mails (SPF, DKIM, DMARC)
A ausência ou má configuração dos protocolos de segurança de e-mail como SPF (Sender Policy Framework), DKIM (DomainKeys Identified Mail) e DMARC (Domain-based Message Authentication, Reporting, and Conformance) expõe a organização a diversos ataques cibernéticos, especialmente spoofing e phishing, que podem ser realizados utilizando domínios legítimos da empresa.
Esses ataques têm como objetivo enganar destinatários e obter informações sensíveis ou causar danos reputacionais. O SPF permite que a organização defina quais servidores estão autorizados a enviar e-mails em nome de seu domínio, enquanto o DKIM garante a autenticidade das mensagens por meio de assinaturas digitais que confirmam que o conteúdo do e-mail não foi alterado durante o envio.
O DMARC funciona como uma camada adicional que permite às organizações definir políticas de verificação de e-mails, além de fornecer relatórios sobre tentativas de abuso de seus domínios.
Risco
E-mails falsificados podem ser usados para enganar clientes, parceiros e funcionários, levando a comprometimento de contas, roubo de dados confidenciais, fraude financeira e até mesmo ataques direcionados que exploram a confiança da marca.
Certificados expirados
Certificados SSL/TLS expirados comprometem não apenas a confiança dos usuários, mas também a segurança das comunicações da organização. A falta de renovação desses certificados pode expor os sistemas a riscos, como interceptações de dados e perda de credibilidade perante clientes e parceiros.
Quando os navegadores detectam um certificado expirado, exibem alertas que desestimulam os usuários a continuar navegando no site, afetando negativamente a experiência do cliente e a reputação da empresa. Certificados válidos garantem que as conexões são criptografadas e autênticas, reduzindo significativamente a probabilidade de ataques, como o man-in-the-middle (MitM), onde hackers interceptam e manipulam informações sensíveis em trânsito.
Risco
- Usuários podem ser alertados sobre a insegurança do site, resultando em perda de acesso ao serviço, interrupções operacionais e queda de confiança. Além disso, atacantes podem explorar certificados expirados para realizar ataques de man-in-the-middle ou outras atividades maliciosas.
Compreender os vetores de ataque mais comuns é essencial para implementar estratégias de defesa eficazes e reduzir as chances de exploração.
Exemplos reais de exposição
Ao buscar por serviços RDP expostos, é possível encontrar sistemas que permitem acesso remoto à área de trabalho. Por exemplo, uma pesquisa na plataforma fofa com o filtro para porta RDP 3389, retorna dispositivos com a porta RDP aberta.
Em um caso específico, foram encontrados mais de 08 milhões de resultados, indicando uma ampla exposição desse serviço, conforme demonstra imagem abaixo.
Agora utilizando a plataforma Shodan.io, foi possível identificar um grande número de dispositivos com a porta 22 aberta. Em uma busca específica, foram encontrados mais de 21 milhões de resultados, conforme ilustrado na imagem abaixo.
Os países com maior número de dispositivos expostos incluem os Estados Unidos, China e Alemanha, indicando uma ampla exposição global desse serviço crítico.
O acesso remoto a servidores e sistemas é uma prática comum para a administração de redes corporativas. Entre os protocolos bastantes utilizados para essa finalidade estão o SSH (Secure Shell) e o RDP (Remote Desktop Protocol). Ambos permitem que administradores gerenciem máquinas remotamente, mas a exposição indevida de suas respectivas portas na Internet pode representar riscos significativos à segurança cibernética.
O protocolo SSH é amplamente utilizado para acesso remoto seguro a servidores baseados em Linux e Unix, oferecendo uma conexão criptografada que protege contra interceptações de dados. No entanto, quando a porta 22 está exposta de forma indevida na Internet, pode facilitar ataques de força bruta e a exploração de vulnerabilidades conhecidas no serviço SSH. Esses ataques podem resultar em acessos não autorizados a servidores, comprometendo dados e sistemas críticos.
De forma semelhante, o protocolo RDP é amplamente utilizado para acesso remoto a ambientes Windows, permitindo que usuários controlem máquinas remotamente com uma interface gráfica. Quando a porta 3389 está exposta, os riscos são igualmente elevados, pois a exposição pode permitir ataques de força bruta e acessos não autorizados. Essa situação é frequentemente explorada por cibercriminosos em campanhas de ransomware, sequestro de dados e uso indevido de recursos computacionais.
Esses exemplos reforçam a importância de implementar boas práticas de segurança para proteger serviços de acesso remoto. A negligência na proteção desses serviços pode resultar em consequências graves para a segurança das organizações, comprometendo tanto a confidencialidade quanto a integridade dos sistemas expostos.
Casos reais de ataques cibernéticos
A seguir, apresentamos alguns exemplos práticos de incidentes reais envolvendo a exposição indevida de serviços críticos, como RDP e SSH. Esses casos ilustram como a falta de controles adequados pode resultar em acessos não autorizados, comprometimento de dados e ataques cibernéticos significativos.
Organização do setor financeiro – 2021
Em 2021, uma organização do setor financeiro foi alvo de um ataque cibernético após expor um serviço de Remote Desktop Protocol (RDP) à internet sem a devida proteção. Os invasores conseguiram identificar o serviço acessível por meio de escaneamentos massivos, prática comum utilizada para mapear portas e serviços expostos. Para se aproveitar dessa brecha, os atacantes iniciaram um ataque de força bruta contra o RDP, tentando inúmeras combinações de usuário e senha até conseguirem acesso bem-sucedido ao sistema.
A falta de autenticação multifator (MFA) e a presença de credenciais fracas facilitaram a violação. Após obterem controle sobre o servidor, os criminosos implantaram ransomware, que rapidamente criptografou os servidores críticos da organização, afetando sistemas financeiros essenciais para o funcionamento da empresa.
Como consequência, as operações financeiras foram interrompidas por vários dias, resultando em prejuízos operacionais significativos. Os invasores, como parte do ataque, exigiram pagamento de um resgate em criptomoedas em troca da chave de descriptografia.
Organização do setor de saúde – 2022
Em 2022, uma organização do setor de saúde foi alvo de um ataque cibernético devido a um serviço SSH exposto à internet que estava mal configurado e rodava uma versão desatualizada do OpenSSH. Essa versão continha uma vulnerabilidade conhecida que permitia a execução remota de código, o que possibilitou o comprometimento do servidor.
Os atacantes aproveitaram essa vulnerabilidade para obter acesso root ao servidor comprometido, o que lhes garantiu controle total sobre o sistema. Com acesso privilegiado, os criminosos roubaram dados confidenciais de pacientes, incluindo informações sensíveis sobre diagnósticos e tratamentos.
Após o roubo dos dados, os invasores ameaçaram divulgar as informações caso um resgate não fosse pago. O incidente causou grande impacto na reputação do hospital, gerando desconfiança por parte dos pacientes e da sociedade. Além disso, a organização sofreu sanções regulatórias por não ter adotado as medidas de segurança adequadas para proteger os dados dos pacientes, agravando ainda mais as consequências do ataque.
Esses cenários reforçam a necessidade de implementar medidas proativas para minimizar a superfície de ataque e proteger os ativos da organização.
Por que gerenciar a superfície de ataque?
O gerenciamento da superfície de ataque é uma prática indispensável para garantir a segurança cibernética em organizações de todos os portes e setores.
Em um cenário onde os ataques cibernéticos crescem tanto em frequência quanto em sofisticação, e os ambientes tecnológicos estão cada vez mais complexos, é fundamental identificar, monitorar e reduzir possíveis pontos de vulnerabilidade. Essa abordagem proativa é essencial para proteger dados sensíveis, assegurar a continuidade das operações e preservar a reputação corporativa perante clientes, parceiros e o mercado.
Como já falamos neste artigo, com a digitalização em ritmo acelerado, a superfície de ataque de uma organização está em constante expansão. Por isso, o gerenciamento da superfície de ataque vai além da simples proteção de ativos digitais; ele também garante a resiliência da organização frente aos desafios da transformação digital.
Ao adotar práticas eficazes de gestão, as organizações podem antecipar riscos, implementar medidas preventivas e garantir um ambiente tecnológico mais seguro e preparado para o futuro.
Medidas de segurança para mitigar riscos e ameaças
São elencados abaixo pela ISH, medida que poderão ser adotadas visando a mitigação dos referidos riscos e ameaças citados neste relatório, como por exemplo:
Gerenciamento da superfície de ataque
- Mapear e inventariar ativos: Identificar todos os sistemas, serviços, dispositivos, e endpoints acessíveis na organização.
- Desabilitar recursos desnecessários.
- Fechar portas e desabilitar serviços desnecessários.
- Monitoramento contínuo: Implementar soluções de gerenciamento de superfície de ataque (Vulnerability Prioritization Technology – VPT) para identificar novas vulnerabilidades e riscos associados a organização.
Fortalecimento da segurança de redes
- Segmentação de rede: Dividir a rede em segmentos para limitar o impacto de um ataque.
- Uso de VPNs: Garantir que o acesso remoto seja feito exclusivamente por VPNs seguras.
- Firewalls e IDS/IPS: Configurar firewalls e sistemas de detecção e prevenção de intrusões.
- TLS/SSL atualizados: Garantir que todos os canais de comunicação utilizem certificados atualizados e configurações seguras.
Proteção de aplicações Web
- Implementar WAF (Web Application Firewall): Proteger contra ataques comuns como injeções SQL, XSS, e outros.
- Monitoramento de plugins e bibliotecas: Garantir que todas as bibliotecas, temas e plugins de aplicativos (como WordPress) estejam atualizados.
- Revisões de código: Realizar auditorias regulares no código de aplicações para identificar vulnerabilidades.
Gerenciamento de vulnerabilidades
- Aplicação de patches: Priorizar a aplicação de patches para vulnerabilidades críticas.
- Ferramentas de varredura de vulnerabilidades: Utilizar soluções como VPT para identificar fraquezas.
Autenticação e controle de acesso
- Implementar MFA (Autenticação Multifator): Reduzir o risco de ataques baseados em credenciais comprometidas.
- Política de senhas fortes: Exigir senhas complexas e mudanças regulares.
- Revisão de privilégios: Garantir que usuários tenham apenas os acessos necessários (princípio do menor privilégio).
- Proteção de credenciais vazadas: Monitorar bancos de dados de credenciais vazadas para verificar se credenciais da organização estão comprometidas. Exemplo de ferramenta: Mantis DRPS.
Entre em contato com o time de consultores da ISH para saber mais sobre como fazer o gerenciamento da superfície da ataque do seu negócio de forma eficiente, garantindo a segurança e continuidade de suas operações.